Como todos os outros sentimentos, o medo é bastante adaptativo em uma grande variedade de situações. Sentir medo é o que nos impulsiona a sair rapidamente quando um carro vem na nossa direção ou a não nos expor a situações e lugares que colocam nossa sobrevivência em risco.
Mas, quando se trata de eventos seguros como andar de avião, é a sua avaliação da situação que vai fazê-la parecer perigosa, mesmo não sendo. É importante identificar quais são seus pensamentos automáticos em relação a isso, como:
“Tem uma grande chance de o avião cair”
“Aviões são perigosos”
Quem trabalha juntamente com esses pensamentos automáticos é o foco atencional. Você pode prestar exagerada atenção a situações que comprovem esse pensamento, como lembrar exclusivamente de acidentes aéreos. Um comportamento associado a isso é o de pesquisar excessivamente esse tipo de notícias ou programas de TV. Usando o foco nessas informações, elas se tornam muito mais frequentes na sua mente e fazem com que você conclua que aviões realmente são perigosos e você está em risco se entrar em um. O sentimento subsequente claramente será o medo e possivelmente a evitação desse tipo de situação.
Avaliar a situação de forma menos parcial pode ajudar bastante a diminuir o perigo percebido. Compare o avião com situações que também envolvem risco, mas que você não apresenta tanto medo, como andar de carro. Acidentes de carro são muito mais comuns do que acidentes de avião. Compare o número de mortes decorrentes desse tipo de acidente com as decorrentes de gripe, por exemplo. Fui rapidinho pesquisar no Google pra apresentar esses dados
“Um estudo realizado no Reino Unido diz que a probabilidade de um acidente aéreo é de um a cada 67 mil voos, e que a chance de um acidente com morte ocorrer é de um para cada 345 mil voos. Já estudo realizado nos Estados Unidos, pelo Departamento Nacional de Segurança nos Transportes, analisou todos os acidentes aéreos ocorridos entre 1983 e 2000 e descobriu que de 53.487 pessoas envolvidas em acidentes, 51.207 sobreviveram.”
Você pode ler a matéria completa aqui.
Pesquisando sobre mortes decorrentes de gripe eu encontrei:
“Todo ano a gripe mata cerca de 500 mil pessoas no mundo e 50 mil somente no Brasil.”
A matéria você encontra aqui.
Ninguém costuma sentir muito medo de morrer quando pega gripe, certo? Isso porque nos deparamos com experiências de gripe o tempo todo, quando pegamos gripe ou quando alguém que conhecemos apresenta a doença. É pouco frequente a morte de algum conhecido por gripe, portanto, fazemos a avaliação que gripe não é muito perigosa.
Embora as viagens de avião estejam cada vez mais comuns, o número de viagens feitas por você ou por conhecidos pode não ser tão expressivo para generalizar como seguro. Mas, nessa situação, um dado importante é a atenção que um acidente aéreo recebe. É muito provável que se alguém morra em um acidente aéreo você fique sabendo e isso não acontece de forma nenhuma com mortes por gripe. Então sofremos de uma superexposição a situações perigosas provocadas por aviões e isso influencia nossa avaliação.
Resumindo, para reduzir o medo, compare as evidências de situações envolvendo aviões. Compare seu histórico de voos com os acidentes que você já sofreu em um avião. Faça o mesmo com o histórico de pessoas que você conhece.
Aí, é muito comum vir a frase:
“Eu preciso ter certeza que não vou sofrer um acidente e morrer”
Não tem como, mas você também não tem certeza disso sentado na sua casa lendo essa postagem. Essa certeza não existe.
A pergunta relevante nesse caso é: Se você precisa voar, prefere fazer isso com muito medo ou mais tranquilo?
Caso você esteja evitando voar por medo: Realmente está valendo a pena perder as situações por medo?
Se você achar interessante diminuir o medo e a evitação, essa estratégia de avaliação dos seus pensamentos pode ajudar.
A ansiedade também tende a diminuir frente à uma situação de medo. Lembre-se de alguma situação que te deixava ansioso no passado (dirigir, andar de elevador, fazer uma apresentação). Se a ansiedade frente a essas situações diminuiu, um dos fatores que provavelmente contribuiu foi se expor a essa atividade várias vezes. Conforme você se expõe, a situação parece menos perigosa e você se sente mais confiante.
_____________________________________________________________________________
Referências: Clark, D.A, & Beck, A.T. (2002). Terapia cognitiva para transtornos de ansiedade. Porto Alegre: Artmed.
Foto: Gratisography / Ryan McGuire